A relação entre ser e devir
- Ana Luiza Faria
- 28 de ago.
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Por Ana Luiza Faria

Entre as perguntas mais antigas da filosofia, uma permanece sempre atual: o que significa “ser” e como isso se relaciona com o “devir”? Desde os pensadores da Grécia Antiga até reflexões contemporâneas, essa tensão acompanha nossa existência cotidiana.
O ser, em linhas simples, é aquilo que buscamos como estabilidade: nossa identidade, valores, memórias e a sensação de continuidade no tempo. É o ponto de referência que nos dá sentido e que nos permite dizer: “eu sou”. Sem essa âncora, nos perderíamos na fluidez do mundo. Porém, essa âncora não é estática. Por mais que desejemos constância, estamos em constante transformação. É aqui que entra o devir.
O devir é o movimento, o fluxo inevitável da vida. Tudo o que existe está em processo de mudança: nossos corpos, pensamentos, relações, desejos e até as formas como compreendemos a nós mesmos. É no devir que se abre a possibilidade de renovação, de novos caminhos e de futuros inesperados. Enquanto o ser aponta para a permanência, o devir nos lembra da impermanência.
Muitas vezes, vivemos o conflito entre os dois. Há quem se apegue demais ao ser, buscando uma identidade fixa, tentando manter a vida em uma rigidez que não acompanha o tempo. Por outro lado, há quem viva apenas no devir, sem referências sólidas, mergulhando no movimento sem encontrar um chão. Nenhum dos dois extremos traz equilíbrio. O desafio está em habitar o intervalo, esse espaço delicado em que ser e devir se encontram.
Na prática, isso significa reconhecer que somos feitos de história, mas também de possibilidades. Uma pessoa não é apenas sua biografia aquilo que já viveu e que a define, mas também o que ainda pode se tornar. O ser guarda a memória; o devir abre a esperança. Somos sempre uma mistura de continuidade e transformação.
Podemos perceber isso em momentos simples da vida. Um reencontro com alguém do passado mostra como permanecemos os mesmos em certos aspectos, mas também revela o quanto nos transformamos. A cada experiência, nossos contornos se redesenham. Carregamos em nós marcas profundas, mas elas não nos condenam a uma forma única de existir.
Essa relação entre ser e devir é também um convite a olhar para o presente com mais leveza. Quando entendemos que a vida não é apenas estabilidade nem apenas mudança, mas o encontro entre ambas, podemos lidar melhor com as incertezas. Reconhecemos que há partes de nós que permanecem, mas também aceitamos o fluxo que nos atravessa.
Em termos existenciais, isso significa aceitar que nunca estaremos prontos, mas também nunca estaremos totalmente perdidos. Somos processo e permanência ao mesmo tempo. Esse paradoxo é, em si, a beleza da condição humana.
Ao refletir sobre o ser e o devir, aprendemos a nos enxergar com mais compaixão. Não precisamos ser sempre iguais, nem precisamos nos dissolver em mudanças incessantes. Podemos, simplesmente, existir nesse movimento delicado, reconhecendo que a vida é feita de raízes e ventos: uma parte que nos sustenta e outra que nos leva adiante