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A sutileza das ausências que não sabemos nomear

  • Foto do escritor: Ana Luiza Faria
    Ana Luiza Faria
  • 1 de ago.
  • 2 min de leitura

Por Ana Luiza Faria


Colagem surrealista sutil com fundo de papel levemente amassado. Mulher observa ao longe, cercada por flores secas, linhas finas douradas e formas orgânicas, representando as ausências que não sabemos nomear.
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Há ausências que não fazem barulho. Não têm despedida, não avisam que estão indo embora e nem sempre deixam rastros evidentes. Apenas se instalam lentamente, ocupando os cantos da rotina com um silêncio estranho e, ainda assim, profundamente familiar. São ausências que não sabemos nomear, mas sentimos no corpo, no humor, na leve alteração do olhar sobre o mundo.


Talvez seja a ausência de nós mesmos em nossas próprias escolhas. Ou de um olhar que costumava nos reconhecer. Talvez seja a falta de um tipo específico de presença não física, mas emocional que dava contorno aos dias, mesmo quando tudo parecia igual.


Essas ausências sutis não são exatamente perdas. Elas não têm data, nem luto declarado. São esvaziamentos, dissoluções imperceptíveis. Um costume que deixou de acontecer, uma palavra que parou de ser dita, um toque que não voltou mais. De repente, há algo fora do lugar e não sabemos o que.


É fácil identificar o que dói de forma nítida. Um rompimento, uma mudança brusca, uma notícia inesperada. Mas e o que dói de modo sussurrado? E o que nos atravessa devagar, quase sem deixar marca, mas muda completamente a atmosfera de dentro?


Às vezes, não é a ausência de alguém que machuca, mas a ausência de algo que não conseguimos explicar. O cuidado que foi rareando. A atenção que já não encontra tempo. O encanto que se dissolveu sem alarde. A escuta que passou a ser ocupada por distrações. A reciprocidade que virou eco.


Nosso cotidiano é cheio dessas pequenas ausências. E quando elas se acumulam, vamos nos tornando versões mais cansadas de nós mesmos, mesmo sem saber por quê. O corpo começa a reagir antes da mente entender: insônia, apatia, irritação sem motivo aparente. O mundo parece igual, mas algo dentro já não responde da mesma forma.


Nomear essas ausências é um ato de coragem. Requer pausa, escuta e delicadeza. É olhar para dentro sem pressa, com disposição para sentir o que ainda não tem forma. É aceitar que o que nos falta, muitas vezes, não é tangível e, ainda assim, nos molda por dentro.


Talvez estejamos falando da ausência de significado. Ou da falta de um vínculo verdadeiro em meio a tantas conexões. Talvez seja a ausência de reconhecimento. De um espaço seguro. De palavras que façam sentido. De um tempo que nos pertença.


Não saber nomear o que falta não nos torna frágeis. Nos torna humanos. E reconhecer isso pode ser o início de um novo gesto de presença consigo, com o outro, com a vida. Porque, às vezes, o que mais precisamos é dar nome ao que não sabemos sentir. Para, então, começar a cuidar.

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