O que fazemos com os sentimentos que adiamos por anos?
- Ana Luiza Faria
- 30 de jul.
- 2 min de leitura
Por Ana Luiza Faria sentimentos que adiamos

Alguns sentimentos não desaparecem com o tempo. Eles apenas aprendem a esperar. Ficam guardados em silêncios que nem sempre sabemos nomear, nas pausas longas de um suspiro, nos gestos que escapam do controle.
Adiar o que sentimos pode ser um mecanismo de defesa. Em muitos momentos, foi o que nos permitiu seguir. Congelamos dores para não desmoronar. Fingimos que não sentimos para sobreviver às exigências da vida. Mas o que é adiado emocionalmente não deixa de existir apenas se aloja em cantos mais profundos do corpo e da memória.
Quantas vezes você já seguiu em frente sem elaborar o que ficou para trás? Sem se despedir de uma dor, de um luto, de uma culpa, de uma vergonha? Aquilo que não encontramos espaço para sentir se transforma em sintomas: insônia, ansiedade, cansaço crônico, irritabilidade, um peso inexplicável no peito. O corpo passa a falar por aquilo que não foi dito.
Esses sentimentos adiados, ao longo do tempo, moldam o modo como nos relacionamos, como reagimos, como confiamos ou nos afastamos. Eles assombram conversas, dificultam decisões, sabotam encontros. E o mais sutil: criam versões nossas que atuam no mundo tentando proteger algo que nunca teve chance de ser cuidado.
Mas o que fazemos com tudo isso agora?
Primeiro, reconhecemos que os sentimentos não vencidos pelo tempo não são sinal de fraqueza são memórias emocionais que precisam de escuta. Não se trata de cavar o passado, mas de dar um lugar digno ao que foi deixado sem resposta. Isso pode acontecer aos poucos: em um espaço terapêutico, em um diário, em uma conversa honesta com alguém de confiança.
Depois, aprendemos a sustentar o desconforto. Sentir não é confortável, mas é necessário. O caminho do amadurecimento emocional passa por reconhecer o que sentimos, mesmo quando isso parece desconcertante. É assim que deixamos de repetir padrões antigos: não mais reagindo por impulsos automáticos, mas respondendo com consciência.
Por fim, compreendemos que os sentimentos guardados não querem nos punir, apenas serem vistos. Eles não pedem explicações lógicas, mas acolhimento. Quando os olhamos com gentileza, algo em nós se reorganiza. Deixamos de ser reféns do que escondemos e passamos a ser autores daquilo que sentimos.
A pergunta talvez não seja mais "por que adiei isso por tanto tempo?", mas "o que posso fazer com isso agora, com a maturidade que tenho hoje?"
Sentir pode parecer perigoso, mas evitar tem um custo ainda mais alto. Os sentimentos não somem. Eles esperam. Até que, um dia, você os olhe e, com sorte, os transforme.


