As camadas que o tempo não leva: sobre silêncio, autoconhecimento e escuta interna
- Ana Luiza Faria
- há 2 dias
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Por Ana Luiza Faria

Há silêncios que parecem descanso, e outros que, aos poucos, vão ganhando peso. No início, parecem apenas pausas uma indisposição leve, uma vontade de não precisar responder, uma presença parcial nas próprias escolhas. Mas com o tempo, tornam-se espessuras: o corpo está presente, mas algo dentro já se ausentou. A vida continua em movimento, mas a alma parece andar alguns passos atrás.
Nem sempre esse estranhamento vem acompanhado de dor visível. Às vezes, é apenas um cansaço sutil, um leve distanciamento de si. O cotidiano segue funcionando, as tarefas são cumpridas, e ainda assim... há um descompasso que não se nomeia. Nesses momentos, muitas pessoas se afastam de si sem perceber até que algo pequeno estala. Uma conversa que incomoda, uma música que atravessa, um choro que surge do nada. E a pergunta ecoa: o que ficou escondido atrás desse silêncio?
Dizem que o tempo cura. Mas o tempo, por si só, não cura apenas acomoda. As experiências não vividas, os sentimentos não nomeados, os vazios deixados para depois... tudo isso segue em nós. Não como ruído explícito, mas como camadas sutis que interferem no presente. E, com o tempo, aquilo que não foi escutado começa a se manifestar de outras formas: insônia, irritação, desconexão. É o corpo tentando expressar o que a consciência ainda não acessou.
A escuta interna é um movimento delicado. Ela não exige pressa nem conclusões. Autoconhecimento não é sobre entender tudo, mas sobre permitir que partes esquecidas de si possam finalmente ter voz. É um processo de refinamento sensível, em que a saúde emocional começa a se construir não a partir de grandes decisões, mas de pequenos gestos: uma pausa real, uma pergunta honesta, um espaço onde não é preciso se justificar.
E o corpo, muitas vezes, percebe antes da mente. A tensão nos ombros, o aperto no peito, o sono fragmentado. Cada um desses sinais é uma forma de linguagem emocional. Quando escutados com atenção, eles se tornam portais não de urgência, mas de retorno. Retorno ao que sentimos, ao que fomos adiando, ao que ainda pulsa e quer existir.
Escutar-se é um ato de coragem silenciosa. Um gesto de intimidade com o que somos agora. Não se trata de estar “pronto”, mas de estar disponível. A psicoterapia, nesse contexto, pode ser esse lugar onde o sentir não precisa ser interrompido, onde o autoconhecimento floresce como consequência da escuta, não como exigência de performance.
E talvez, no fim, você não esteja buscando respostas. Talvez tudo o que falte seja um lugar onde a sua experiência possa ser acolhida sem tradução.
O que dentro de você ainda espera por escuta?