O inconsciente e seus paradoxos
- Ana Luiza Faria
- 20 de set.
- 2 min de leitura
Por Ana Luiza Faria

Há em nós uma região silenciosa, invisível aos olhos do cotidiano, mas que move cada gesto com a força de um enigma. Chamamos de inconsciente, como se nomear fosse suficiente para contê-lo. No entanto, quanto mais o tentamos definir, mais ele escapa, mais revela seus paradoxos. É nesse território onde o oculto se mistura com o evidente, onde o reprimido encontra maneiras criativas de emergir, que a existência se revela complexa.
O inconsciente carrega memórias que juramos ter esquecido. Ele não esquece. Um cheiro súbito pode trazer de volta uma cena inteira, com cores, sensações e até mesmo lágrimas que já pareciam dissolvidas no tempo. O paradoxo está aí: o que tentamos calar, retorna, não como repetição mecânica, mas como um fragmento que insiste em se inscrever na vida presente.
Também é no inconsciente que o desejo se esconde, mas nunca adormece. Muitas vezes acreditamos que sabemos o que queremos, quando na verdade seguimos guiados por forças que não passam pelo crivo da razão. O desejo inconsciente não é linear, não é lógico e é justamente essa desordem que nos mantém em movimento. Ele nos leva a escolhas inesperadas, a quedas inexplicáveis, a paixões improváveis. A racionalidade, sozinha, não dá conta de explicar por que certos caminhos nos atraem mais que outros.
Outro paradoxo: o inconsciente revela a verdade disfarçada em mentira, e a mentira embutida em uma aparente verdade. O sonho, por exemplo, inventa narrativas absurdas que, no entanto, dizem mais sobre nós do que gostaríamos de admitir. O lapso, o ato falho, a palavra atravessada são pequenas brechas por onde ele se anuncia. Tentamos manter o controle, mas ele se infiltra nas fissuras da linguagem, lembrando-nos de que somos mais vastos do que aquilo que conseguimos enunciar.
Viver, então, é lidar com essa zona de sombra que insiste em nos habitar. Não se trata de eliminá-la, mas de escutá-la. Os paradoxos do inconsciente nos lembram que não somos donos absolutos de nós mesmos, e talvez seja justamente nesse descontrole que se encontre a possibilidade de criação, de liberdade e de reinvenção.
O inconsciente nos desconcerta, mas também nos oferece profundidade. Nos coloca diante de uma pergunta essencial: será que precisamos mesmo compreender tudo para viver plenamente? Ou talvez a vida se sustente nesse equilíbrio instável, onde razão e mistério se entrelaçam sem jamais se dissolver por completo.
O inconsciente e seus paradoxos


