Para Além da Razão: Desconstruindo a ideia de que "Tudo tem uma razão"
- Ana Luiza Faria
- 20 de ago. de 2023
- 2 min de leitura
Por Ana Luiza Faria

No meio do turbilhão de pensamentos e percepções, nos deparamos com a ideia reconfortante de que "tudo ocorre por uma razão". Essa afirmação nos traz uma sensação de tranquilidade, como um abraço mental, enquanto enfrentamos as complexidades da existência. No entanto, é válido questionar se essa incessante busca por razões realmente nos traz serenidade ou se, na verdade, nos afunda ainda mais no labirinto de nossas próprias expectativas e conjecturas.
Ao questionarmos a suposta sensação de segurança proporcionada pela crença de que tudo tem uma razão, nos lançamos nas profundezas da reflexão. De fato, podemos sentir a pressão de acreditar que há uma lógica subjacente a cada acontecimento, a cada chuva, a cada sorriso e a cada obstáculo. Porém, precisamos considerar se isso é verdadeiramente uma fonte de conforto ou se é apenas uma muleta que nos afasta da verdadeira vivência da vida.
As palavras de Nietzsche ressoam de maneira impactante: "Não temos ouvidos para aquilo que não temos acesso por meio da experiência." O cerne dessa afirmação nos leva a uma compreensão fundamental: nossos sentidos são as portas que nos conectam ao mundo, e é através deles que construímos nossas percepções. Primeiramente, absorvemos a realidade, captando-a com nossos olhos, ouvidos, tato, paladar e olfato. Somente após essa conexão sensorial é que atribuímos nome e razão às coisas.
A sugestão audaciosa de inverter a premissa nos convida a uma reflexão intrigante. "Permita-se desapegar, nada ocorre por uma razão intrínseca, mas você pode atribuir a razão que preferir a cada situação." Aqui, emerge a liberdade de interpretar o mundo conforme nossa perspectiva, de atribuir motivos que estejam alinhados com nossa própria narrativa. Afinal, a razão é uma construção humana moldada por contextos históricos, geográficos e culturais. O que um dia foi aceito como incontestável em um lugar ou época, pode ser questionado e reformulado em outro contexto.
Essa perspectiva também nos leva a reconsiderar profundamente as abordagens terapêuticas da psicologia. A ideia de que nossos comportamentos são unicamente moldados pelo pensamento pode ser limitada. Desconsiderar a influência de nossos sentidos e das experiências subjetivas é negligenciar uma dimensão essencial de nossa compreensão do mundo. A jornada individual não se trata apenas de racionalidade, mas também de uma interação entre as sutilezas sensoriais e emocionais presentes em cada momento.
Temos o costume de nos agarrarmos a categorizações e conceitos pré-concebidos, buscando a segurança da previsibilidade. No entanto, essa busca por estabilidade pode nos impedir de enxergar as infinitas possibilidades diante de nós. Ao nos apegarmos rigidamente às nossas convicções, corremos o risco de sufocar a verdadeira essência da experiência, a novidade constante que nos aguarda.
Dessa forma, chegamos à conclusão com as palavras perspicazes de Nietzsche: "Convicções são mais prejudiciais à verdade do que mentiras." Na ânsia de encontrar explicações, podemos nos envolver em ilusões reconfortantes que obscurecem a verdadeira natureza do mundo. Que possamos, em vez disso, acolher a incerteza, abraçar o desconhecido e permitir que nossos sentidos, curiosidade e perspectivas frescas nos guiem pelo caleidoscópio das experiências, em busca de uma compreensão genuína e profunda.